Nos meus velhos tempos de Office Boy larápio, existia uma prática muito comum nas locadoras que eu exercitava praticamente todo dia em meus horários de almoço, e essa prática me proporcionava conhecer os jogos do console negro 16bits da Sega antes mesmo que eu pudesse adquirir um. Claro que eu estou me referindo à saudosa jogatina por tempo, coisa muito popular no início da década de 90, e que praticamente sozinha, foi a grande responsável por iniciar a paixão que eu tenho hoje pelo Mega Drive.
Jogar videogame por tempo era uma regra na minha rotina de entregas diárias. Todo santo dia eu engolia o almoço no tempo recorde de 15 minutos, pois mais importante que uma boa digestão, era poder gastar alguns trocadinhos na gamelocadora do bairro onde meu serviço se situava, uma meia hora mágica que proporcionava diversão em doses alarmantes, capazes de me fazerem até mesmo perder a hora de bater o cartão algumas vezes. O motivo era um só: o Mega Drive e as duas prateleiras lotadas de jogos que o dono do recinto tinha, coisa que para um dono de Phantom System, console de uma geração que começava a se tornar ultrapassada, era algo digamos, tão magnético quanto o bumbum da Shakira em movimento. Eu simplesmente não conseguia passar perto do lugar sem ser sugado para dentro, nem que fosse para dar uma espiadinha mísera na TV ligada com alguém jogando.
E é bem verdade que ali naquele local até apertado que eu tanto frequentei, o Mega Drive e seus jogos que não paravam de aparecer começavam a me fisgar para o Lado Negro da força, mas não me aprofundarei nesta história por enquanto, pois o que vale para este especial, é a experiência que tive para com alguns dos games que eu acabei por terminar antes mesmo de adentrar definitivamente naquela nova geração que se fortalecia. E foram vários os games que eu terminei ali, jogando por tempo… Dentre eles, títulos como Valis 3 e Thundre Force III, que me proporcionaram até algumas horas de jogatina gratuita quando o dono da locadora percebeu que eu estava prestes o terminá-los sendo que ele mesmo queria ver os finais. Thunder Force III tem até uma boa história comigo, mas o mardito do Jeff já resenhou este título aqui no especial, e me tirou assim, a chance de contá-la para vocês (ou não?).
Mas outro shmup que eu detonei naquela época que precedeu a compra do meu primeiro e único Mega Drive também me rendeu muitas boas horas de diversão, e muito bem pagas por sinal: Steel Empire, um shmup no mínimo surpreendente, desenvolvido pela extinta Hot-B, e que chegou aos States pelas mãos da defunta Flying Edge.
Tudo aconteceu naquele início de tarde em que eu cheguei na dita locadora (que eu realmente não me lembro se era só de games ou se alugava filmes também) e alguns apetitosos títulos novinhos haviam acabado de serem adicionados à prateleira. Steel Empire foi, por total acaso, a primeira caixinha dentre as novatas que eu peguei para olhar o verso, percebi logo que se tratava de um jogo de navinha, e como eu estava um pouco propenso a este gênero naquela época (culpa de Thunder Force III), resolvi jogar sem nem parar para olhar o restante dos novos games. Resultado: cheguei atrasado no serviço e levei aquela comidade rabo.
Preocupado eu com o horário? Que jeito! Eu estava era assoviando a música grudenta da primeira etapa do game enquanto me dirigia até o setor, coisa rara de acontecer comigo. Sim, eu havia adorado aquele shmup, e não via a hora de jogá-lo novamente. E durante alguns dias, essa passou a ser a minha rotina: jogar Steel Empire na hora do almoço e chegar atrasado no serviço! Mas o que havia me fascinado tanto naquele jogo?
Bem, fora o fato de muita coisa naquele console negro ainda ser novidade pra mim, o conjunto da obra daquele peculiar shmup fazia a diferença, e olha que eu nem bem entendia muito do assunto! Era uma época em que meu conhecimento sobre o sistema ainda estava se formando, minha praia ainda eram os 8bits do meu querido Phantom System. Então pra mim, tudo o que aparecia naquele console negro constituía uma novidade super atrativa! Mas ainda assim, já era nítida uma certa diferença naquele game, havia nele um capricho que nem todos os games daquele console possuíam. A começar pela abertura, que contava a história de como no ano de 18XX, um império aéreo mal intencionado emergiu e conquistou os céus do mundo pela força bruta de suas enormes naves de combate, restando à uma pequena força rebelde, a missão de por um fim nos maltrapilhos alados. É aí que nós entramos: as forças rebeldes possuem dois poderosos veículos de combate aéreo que são respectivamente… um teco-teco e um dirigível.
Até soa um pouco estranho: um pequeno teco-teco e um frágil dirigível contra uma frota gigante de naves e bases aéreas super poderosas… mas é isso mesmo o que acontece, e o negócio convence logo após a primeira jogada. Podemos escolher entre os dois veículos aéreos antes de cada etapa do game, e eles obviamente possuem poder de fogo, tamanho, velocidade e resistência diferentes. Não se trata de um shmup do estilão “morra com 1 tiro” ou “recolha os power ups e perca tudo quando morrer”, que de modo geral, são padrões em tudo que é jogo de navinha que se vê por aí…
Em Steel Empire o negócio é mais incrementado: as naves não trocam de tiro ou apenas recolhem power ups: elas ganham experiência ao recolher itens e ao destruir as naves inimigas, e evoluem seu poder de fogo e energia à medida que sobem de nível! Quanto maior o nível, maior o poder de fogo e resistência, e mesmo que sejamos abatidos, sempre continuaremos atirando com a potência alcançada até então, isso pelo menos enquanto durarem as vidas extras e os poucos continues que o game nos oferece. Ambas as naves podem atirar para a direita, para a esquerda, e ainda detonar uma bomba que possui 3 níveis de força possíveis, e cada uma dessa funções está alocada a um dos três botões principais do controle do Mega Drive. O sistema de fortalecimento das aeronaves é realmente muito diferente do que se vê por ai, mas ainda assim, existem alguns itens para serem recolhidos pelos cenários, e dentre eles, estão raras vidas extras, os power ups das bombas, e os famosos “droids de apoio”, que aqui, aparecem na forma de dois mini dirigíveis que passam a acompanhar a nave principal e que, como sempre, são extremamente úteis.
A formação dos Droids e o poder das bombas são o mesmo, independente de qual das duas naves iremos jogar, e também a experiência adquirida com uma vale para ambas, mas particularmente, eu sempre preferi sair metendo bala com o dirigível, que responde pelo nome de Zep-01 (o teco-teco se chama Striker). As diferenças entre as naves foi o que me levou a escolher a embarcação como minha favorita: Zep-01 é mais lento e maior do que o Striker, o que o torna mais vulnerável a ataques inimigos, porém, ele tem poder de fogo mais elevado, é mais resistente, e possui uma barra de HP maior, o que no meu caso, garantia a sobrevivência no jogo por um tempo maior. Mas vai da experiência pessoal de cada um escolher uma ou outra nave… O negócio é testar, já que o game permite. O design de fases é propenso a se tornar mais fácil ou mais difícil dependendo da nave escolhida, por exemplo, é difícil jogar com Zep-01 em fases cheias de passagens estreitas e locais apertados, assim como jogar com Striker pode causar muita dor de cabeça na hora de destruir um alvo situado acima dele, e estas situações são tão comuns no game que jogadores mais experientes revezam as naves durante as etapas para facilitar a missão de terminar o game, principalmente em seus modos mais difíceis.
Sabemos que zepelins e teco-tecos datam do início do século passado, tiveram participação na Primeira Guerra Mundial, e o mundo criado para Steel Empire parece ter evoluído a partir daí, como se o design da época tivesse sido mantido enquanto a tecnologia avançava e permitia que cada vez mais e maiores fortalezas voadoras e engenhocas híbridas ganhassem os céus. É o típico estilo Steam Punk, onde tudo possui uma charmosa cara de antiguidade, dos enormes trens a vapor e seus canhões gigantescos, às embarcações voadoras e seus subordinados alados menores. Os cenários são ricos em detalhes, o uso das cores foi muito bem feito de modo a tornar tudo meio que envelhecido, perdido no tempo, e assim como todo bom shooter, as muitas camadas de fundo que se sobrepões para causar aquela bem vinda sensação de profundidade no horizonte estão presentes em quantidade até abusiva! É uma pena que a soma destes efeitos com as constantes explosões, partículas que voam pelo cenário quando alguma grande nave é abatida, projéteis dos mais variados tipos e tamanhos que infestam a tela, e inimigos que não param de aparecer, tudo isso presente simultaneamente na tela, faça com que o game sofra até com certa frequência de um incômodo slowdown, principalmente quando enfrentamos algum sub-líder ou líder de fase. A impressão que temos é que o jogo tem coisas demais acontecendo ao mesmo tempo até para o veloz processador do Mega Drive, famoso por sua notável capacidade de manipulação múltipla de sprites e efeitos, mas é possível que a programação do game não tenha sido tão bem executada bela Hot-B como deveria.
Se é possível se retirar algo de bom desse slowdown, é que ele acaba até ajudando na hora do desespero, pois como o game não apresenta flicker (que é quando as coisas somem devido a sobrecarga no processamento), a lentidão momentânea ajuda muito o jogador na hora de se esquivar daquela chuvarada de tiros, o que diminui um pouco a dificuldade do game, que já não é lá essas coisas: Steel Empire as vezes até se aproxima de um bullet hell, com aquela cacetada de inimigos vindo de encontro por todos os lados disparando dezenas de projéteis e mísseis contra nossas naves, mas como elas possuem HP, é necessário então que ambas recebam muito dano para serem abatidas, o que permite que seja possível se avançar bastante logo na primeira jogada. Falando francamente, o game é bem fácil até, e requer o mínimo de treino e reflexo para ser vencido, sendo mais indicado para jogadores que estavam ainda iniciando no universo dos Shmups.
Alguns líderes e sub líderes se repetem durante a aventura, retornando até mais de uma vez apenas com cores diferentes e mais difíceis, mas mesmo que possamos acreditar que esse repeteco, na pior das hipóteses, tenha sido resultado da pura falta de vontade de criar chefes novos e originais, a diversão que o game proporciona é ótima, principalmente na hora de derrubar alguma fortaleza gigante voadora: vagarosamente vamos avançando por sua superfície enquanto destruímos seus canhões e partes vulneráveis até que o ponto fraco final da monstruosidade metálica se mostre. Essa é apenas uma das variações que o jogo nos mostra, e ainda temos etapas em que o objetivo é apenas fugir, subir a encosta de uma montanha, ou ainda voltar o caminho, um design que funcionou muito bem com a jogabilidade simples e intuitiva do game.
As músicas seguem a variação de jogabilidade e estado emocional em que o jogo se encontra: frenética na hora da fuga, tensa na hora do contra ataque inimigo, incentivadora na hora de partir sozinho para a luta final, e vocês sabem, caros amigos retroaventureiros, que eu sempre fui suspeito para falar de trilhas sonoras em games. Quando eu falo, é por que o negócio realmente é bom, e Steel Empire está um patamar ou mais acima dessa média! Todas as músicas do jogo são legais e muito bem construídas, tanto melodicamente quanto tecnicamente. Algumas delas me voltaram à cabeça imediatamente assim que as escutei novamente, e essa sensação de lembrança é algo que eu adoro quando acontece… Me faz abrir aquele sorrisão na hora! O tema da etapa 6 do game grudou feito Super Bonder em meu cérebro pela segunda vez na minha vida, assoviei ele dois dias inteiros… Bom que ninguém se irritou comigo ainda!
Desenvolvido para definitivamente não seguir as regras impostas pelo mercado mundial de Shmups, Steel Empire chegou quieto e saiu quaaase calado. Apesar das boas críticas recebidas, a falta de dificuldade do título deu uma afugentada nos jogadores fãs do gênero, que em sua maioria, são ávidos por shmups com desafio alto. Mas vale a pena jogar mesmo que por emulador, pois o game diverte bastante e não será necessário muito tempo gasto para que ele seja vencido. Vai com fé, por que este tempinho dedicado ao game certamente lhe trará bons momentos de diversão no comando das naves de combate rebeldes do ano de 18XX, conhecido também com ano Mil, Oitocentos e Sei lá quanto.
Fim

O slogan do antigo RetroPlayers ainda vale pra mim: “também to morto mas tô aí!”
E muito bem acompanhado =)